domingo, 17 de abril de 2011

É uma casa muito engraçada...






O que que tem na casa da Tia Titina? Tem cores, luzes, bonecos e instrumentos musicais divertidos, como uma zabumba de teatro de rua? Tem. Tem simpatia, alto astral, ventinho do litoral e morro com mata pra gente ver da sala? Tem.
E tem sofá bom de deitar, rede boa de balançar, uma tevê quase sempre desligada (tá bom assim) e um notebook danado dando sopa na sala de jantar? Tem.
Também tem um banheiro claro como o alvorecer no sertão? Tem, claro. Tem gatos circulando em silêncio de monge? Sim, senhor. E tem mesa posta com cuscuz (é assim que escreve?), bolo e bolacha da padaria ali perto quando é hora de ritualizar uma refeição rápida? Lógico que tem.
Tudo isso tem na casa de Tia Titina, tem. Livrinhos de criança, tem. Bagunça na sala, tem. Uma festa pros sobrinhos como ninguém... O que é que a casa de Tia Titina tem? Hein?
Tem os ares de Morro Branco, amém. Tem ônibus circulando em frente, vem. Tem uma estante cheinha de livros sobre teatro e dramaturgia - se tem! Tem uma escadaria dos sonhos para sobrinhos em idade de subir e de descer, ora se tem! Tem um espelhão saindo do corredor pra gente se ver com cara de palhaço enquanto escova os dentes, ah, é verdade, também tem! O que é que a casa da Tia Titina tem, blém-blém?
E quando Tia Titina entra na brincadeira, tem melequeiro no chão da sala com cola e papel? Tem. Tem rio feito com folhas coladas e pintadas de azul? Tem. Tem cedê pirata de filme da Disney - num repara, mas, ó, tem. E a gente ainda pode levar pra casa se fizer cara de que quero-este.
Tem de tudo na casa de Tia Titina, onde a sobrinhada se arrancha quando está de temporada natalense, entre um passeio e outro, um banho de mar e uma sessão de cinema, como mostram as fotos acima (clique nelas para ampliar). E você ainda pergunta o que é que a casa da Tia Titina tem? Nem vem, seu não sei quem!

terça-feira, 12 de abril de 2011

Paredões da Parayba








Tudo isso é Johny People, para quem não ligou a pessoa ao nome da cidade.

Uma parábola sobre lei, coragem e imprensa


Numa cena que só à primeira vista parece inexpressiva em "O Homem que matou o Facínora", alguém que vai embarcar numa carruagem passa o dedo sobre a superfície de madeira do meio de transporte do velho oeste e remove uma respeitável camada de poeira. Essa imagem, em sua simplicidade, é como um resumo do filme inteiro. Este clássido de John Ford, com John Wayne e James Stewart, é idolatrado por dez entre dez jornalistas conscientes das debilidades de sua profissão. Trata de uma cidade sustentada por um mito. Uma grossa camada de poeira que o tempo vai assentando mais e mais sem que nenhum de seus moradores queira removar.

A poeira, no caso, é uma lenda conveniente sobre quem matou o mais temido dos bandidos da região. Um pioneiro do legalismo pouco dado às coisas da violência e da frieza emocional leva o crédito - o que, de alguma maneira, ajuda a cidade a rever seu ajuste na mudança dos tempos que é sempre um tema nos melhores westerns (você sabe, aquele momento em que um fiapo de lei, direitos e deveres começa a substituir a pistolagem pura e simples que marcou o desbravamento do oeste selvagem dos zéua lá em cima do Equador).

É por isso que "O Homem que matou o Facínora" lembra muito o nosso "O Berço do Herói", a peça de Dias Gomes que deu origem a um sucesso da televisão, a novela "Roque Santeiro". Porque por um momento - o longo instante de duração do filme - essa verdade incoveniente ameaça vir à tona. E com a revelação, suas consequências. Um momento em que se pesa conveniências, riscos, possibilidade de mudanças drásticas, reviravoltas que obrigam uma comunidade a se rever. E se ela perder o prumo diante da envergadura da própria mentira que a sustenta?

Neste entrecho, a figura de John Wayne surge como se fora uma flor de cacto no filme: ele contém toda a dor de não poder revelar o segredo à cidade - o fato de que foi ele, o homem bruto, o autor do assassinato mais esperado, e não o jornalista almofadinha a quem todos desprezavam até o momento do crime - e toda a ternura reprimida de entender tudo. É de uma superioridade o John Wayne deste filme que comove o espectador, este que priva com ele o conhecimento da verdade. Tudo inspira repulsa misturada com compaixão. Wayne vê esse panorama do alto e passa por ele com a elegância de quem não tem a menor chance de dividir com quem quer que seja sua dor. E ainda perdeu a mulher - para o jornalista almofadinha, que virou senador e acaba de retornar à cidade, dando o play para que o filme comece a desfiar esse novelo ressecado pelo tempo.

Fez algum tempo que revi o filme em DVD. Escrevo aqui a partir de notas que deixei num caderno. E lá também está escrito que este é um filme sobre formas diferentes de coragem que se juntam: o cidadão cego por sua campanha em favor da legalidade e o pistoleiro seguro de sua eficiência, Stewart e Wayne respectivamente. Dito de outra maneira: a peleja entre a realidade acachapante de uma terra sem lei e o empenho sem chances de um homem incapaz de enxergar a extensão do risco que está correndo. Mas Stewart não desiste de implantar aquela legalidade, por mais vulnerável que ela pareça - e seja - no início desse processo. E se o fará, será com a ajuda do inculto mas realista Wayne (que lembra muito o Gene Hackman de um filme que seria feito anos mais tarde, em 1988, o "Mississipi em Chamas", de Alan Parker; o correspondente a Stewart aqui é o procurador ingênuo feito por Willem Dafoe).

"Quando a lenda fica maior do que o fato, publique-se a lenda": a frase é bem conhecida e é a última anotação sobre o filme no meu caderno. Nâo sei se o filme foi sua fonte primária ou se a anotei ali apenas pela coincidência temática. Um filme a rever, sempre.

Postagem em destaque

O último cajueiro de Alex Nascimento

Começar o ano lendo um Alex Nascimento, justamente chamado "Um beijo e tchau". Isso é bom; isso é ruim? Isso é o que é - e tcha...