terça-feira, 8 de dezembro de 2015

O mal, desde sempre

  
Morris West era um escritor de best seller que fazia sucesso entre os sócios do extinto Círculo do Livro. A diferença era que enquanto seus pares se esmeravam em tramas rocambolescas - mas irresistíveis como as dele - sobre golpes de estado, mercenários, conspirações, espionagem e guerrilhas (as fontes inesgotáveis do grande livro da Guerra Fria), West sapecava nas páginas de seus romances figuras como padres afundando em dramas de consciências, cardeais desconfiados de um candidato à santidade e, este com quem topei agora, tardiamente mas não menos prazerosamente, um empresário às voltas com a violência das ditaduras que sufocavam a América do Sul, e particularmente a Argentina, nos anos 70. 


É vero: à beira dos 50 anos, capitulei diante de "Proteu", um livro de Morris West que não conhecia, não resistindo à leitura das três primeiras páginas, de pé, entre as estantes da Biblioteca da Câmara dos Deputados - essa mina de ouro; a biblioteca; não a Câmara, especialmente nos dias que correm. Não tinha mais como parar de ler. E tudo por causa dos dias que correram há muitos e muitos anos. Reencontrei com satisfação Morris West e seu idioma narrativo que funde dramas pessoais e familiares com painéis de momentos dramáticos da historia da humanidade. A título de enredo, só preciso dizer que "Proteu" trata de um empresário como não existem mais, tão incomodado com a sombra da maldade que cai sobre o mundo que resolve montar uma organização destinada a realizar atos de libertação dos mais oprimidos dos oprimidos - os presos políticos, seja na extrema direita ou esquerda (estamos na Guerra Fria, lembrai-vos, queridos irmãos). O cara é uma  espécie de integrante às avessas da nossa famigerada Operação Bandeirantes, para ficar no contexto da época. Enfim, a ficção sobre esse grupo que em muito lembra o do "vitória na guerra" de João Emmanuel Global vai dar numa chantagem do tipo ou-solta-todo-mundo-ou-mando-o-mundo-pelos-ares, com as consequentes discussões éticas que tal dilema desde sempre representou. 

Mas o texto de West reveste tudo de uma ironia fina que nem sempre - ou quase nunca - se encontra com tal intensidade nos best sellers do período. Os diálogos são pimenta pura - com os personagens usando a língua afiada para se espetarem uns aos outros, no que vão revelando a extensão da maldade que é o tema maior do livro. Por isso a leitura, com gosto de releitura, encontra uma atualidade perene mesmo para quem não pega num exemplar editado pelo Círculo do Livro há uns trinta anos. Grande reencontro sentimental - mas é bem mais que isso. Mal sabia West que aquela maldade crônica da raça ainda teria espaço para aumentar e se reinventar, de maneira que seu anti-herói jamais poderia conceber. Aqui mesmo na Câmara em cuja biblioteca encontrei o livro temos um exemplo perfeito.

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