sexta-feira, 11 de março de 2016

Trapalhadas comunistas

O que os revolucionários da Natal de 35 têm a ensinar aos procuradores de Sampa



O que os três patetas do Ministério Público de São Paulo poderiam ter em comum com os revolucionários comunistas da Natal de 1935? As trapalhadas, claro. A diferença é que, no caso da turma do sapateiro José Praxedes, o negócio foi além de um mera citação política que denuncia a própria ignorância. Resultou numa revolta de fato, que se durou apenas uns três dias ainda promete render uns trezentos anos de teses históricas, falsas lendas e pilhérias autênticas. 

Não é pra menos, afinal os caras de 35  deram um susto no Brasil do Estado Novo de Getúlio ao iniciar de supetão um levante na ainda futura Esquina do Continente. E, ao contrário dos três patetas do MP de SP, sem tropeçar nas citações. Veja o caso do comunista Luciano, capaz de declamar ou identificar de ouvido a autoria de uma frase de Marx, ou de Marx citando Lênin - o que já complica bastante. E não importa se fosse Marx citando Hegel, ops, Engels, ou  repercutindo Trotski, ou ainda antecipando Lula. 

Não importa mesmo, porque, pobre noticiário atual à parte, o assunto aqui é uma ficção - ainda que construída habilmente sobre o episódio que tanto pode nos orgulhar quando nos depreciar ainda mais. Nei Leandro de Castro, sempre ele, concentra nessa Dunas Vermelhas - um livro que tanto procurei em sebos para, nas últimas férias, descobrir assim do nada numa feliz reedição dos Jovens Escribas - nossos fracassos de sempre, nossas debilidades de todo dia. Ainda que sob a moldura de um feito histórico. 

Nei Leandro passa a máquina da boa literatura sobre qualquer duna de orgulho que possamos ter por haver precipitado em passado bem distante um enfrentamento que, lá no Sul, o próprio Prestes, ainda que coberto de falso otimismo revolucionário, estava cheio de dedos em detonar. 


Vai além´o narrador tinhoso que também já nos moldou a alma potiguar nas Pelejas de Ojuara e nos fantasmas que habitam a Fortaleza dos Vencidos. Ao contar em tom quase de farsa a aventura sem tutano do que teria sido a revolta natalense - um sapateiro à frente pra não expor os teóricos mal formados, eis apenas um dos poréns narrado nessa reinterpretação de compromisso acadêmico algum - o nosso Jorge Amado caicoense esculpe numa sucessão de capítulos curtíssimos o molde do nosso caráter público e privado, impiedosamente. 

E assim está assentado mais um tijolo da nossa antimitologia segundo Nei Leandro: no lugar das estátuas pomposas que de fato temos - como todos os povos, o que deveria nos eximir - um muro meio bambo onde se penduram desde a gaiatice dos sobreviventes do sertão até a gabolice malemolente dos litorais. Como se vê, nem tão  melhor nem tão pior do que os procuradores sulistas em caça ao nordestino Lula. Em termos de Brasil, no fim das contas, talvez a gente esteja até na média - bem baixa, no presente momento, mas isso é outra conversa.

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